sábado, 7 de fevereiro de 2009

Eluana e o estado de exceção

Tá, eu sei, o título é estranho, mas, e daí?! Todos sabem da minha preocupação com alguns dilemas éticos da modernidade, por outro lado, o que conhecem o 'Luiz Elias pesquisador do direito' sabem da minha fascinação por Carl Schmitt e temas como o estado de exceção, relação entre poder e autoridade, dinâmica do totalitarismo e outros temas que se contrapõem à democracia. Todavia, isso não significa que não seja partidário desta última, aliás, mais do que um democrata, sou um social-democrata, eis uma convicção política inabalável.
O caso de Eluana me fez, nos últimos dias, voltar a pensar sobre a eutanásia e ter uma ideia interessante, mesmo que não seja propriamente minha (isso é muito óbvio para ser inédito), que é a morte como uma categoria de direito fundamental.
Bem, o que me levou a pensar na relação entre estado de exceção e o caso de Eluana foi o noticiário de hoje.
Como se sabe, o caso em comento tem causado grande mobilização na Itália, partidários da Igreja Católica, liberais pró-eutanásia ou simplesmente críticos desta instituição milenar.
O que me surpreendeu foi a decisão do primeiro-ministro italiano Sílvio Berlusconi elaborar um Decreto-Lei (figura legislativa imprópria, já que o Poder Executivo que os elabora, invenção italiana surgida, como deixa bem claro Giorgio Del Vecchio, do bojo experimental do direito italiano que é o direito canônico) que anulou a decisão da Corte de Cassação de Roma que permitia que fosse retirada a sonda que fornecia alimenta Eluana Englaro.
Que exemplo mais típico sobre o estado de exceção do que esse? O poder do executivo chega a ser tão grande que há a possibilidade do mesmo dizer se vale o que diz 'aquele que diz sobre o direito'.
Bem, a frase ficou confusa, em outros termos, o primeiro-ministro da Itália tem uma série tão grande de poderes em suas mãos que o mesmo se vê na possibilidade de confirmar ou não a validade do pronunciamento da mais alta corte de justiça do Estado, isto é algo muito sério!
Mais do que poder político, o permier tem em suas mãos um poder 'biopolítico', segundo Michel Foucault (cf. Em Defesa da Sociedade), biopoder é o completo domínio sobre o cidadão, o poder tão intenso que pode "fazer morrer e deixar viver".
Lembrando a primeira frase do livro "Teologia Política" de Carl Schmitt: "soberano é aquele que decide acerca do estado de exceção". Na minha modesta opinião, Berlusconi nesse caso é soberano, pois o mesmo teve o poder de promover uma suspensão na ordem jurídica no momento em que promulga uma figura legislativa não-parlamentar, decreto com 'força de lei' (que por si só, ao mesmo tempo aberrante e dotada de uma 'autoridade mística', para lembrar Jacques Derrida), com tanto poder que torna nula a atividade do poder judiciário que, em última instância 'diz o que é a lei'.
É o ocaso do sistema democrático, da separação de poderes, por mais que me afirmem que é um fato isolado, vejo isto como o paradigma anômico da modernidade!
O Presidente Giorgio Napolitano disse que não iria ratificar o Decreto-Lei editado por Berlusconi, isto instauraria uma crise na República, tonando claro o antagonismo político schmittiano, onde de lados opostos degladiam-se amigos e inimigos para ver quem tomará a 'decisão política' que fundamentalmente decidirá como deve ser o Estado.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

O caso de Eluana Englaro



Hoje pela manhã li uma matéria que me deixou muito comovido, o nome dela batiza esse texto, Eluana Englaro, uma bela jovem italiana de 38 anos que se encontra há 17 em estado vegetativo e, esta semana seu pai conseguiu autorização da corte de cassação de Roma para realizar a eutanásia, decisão polêmica, que reacendeu um grande debate na Itália sobre a questão da eutanásia.
As pessoas que me conhecem sabem que sou sensível ao tema da eutanásia, já fiz alguns textos sobre o tema, sempre me posicionando favoravelmente, ao arrepio da minha fomação extremamente católica...
Algumas pessoas podem chamar de inconsistência ser contra a pena de morte e, por outro lado, ser favorável à eutanásia, exponho minhas razões nesse momento.
A eutanásia, ao contrário que dizem, não é a instituição velada da pena de morte, ao contrário, é um ato consectário da ideia de dignidade humana e segue o mesmo raciocínio que vai de encontro aos pensamentos pró-pena de morte. Vejamos, se não é lícito dispor da vida de alguém - até mesmo o Estado - da mesma forma, não vejo como eticamente correto prolongar de forma não natural a vida de alguém. Dar duração artificial a uma vida que anseia por evadir-se desta dimensão, na minha opinião, é querer 'brincar de Deus', e, ética e teologicamente, não posso concordar com isso!
A luta do pai para satisfazer o desejo da filha - que em vida sempre externou a vontade de não ser mantida viva de forma artificial, antinatural - chocou vários setores da sociedade italiana, extremamente católica. O próprio Vaticano pronunciou-se sobre a questão, chamando a decisão de assassinato contra um incapaz e coisas do tipo.
O próprio governo italiano - se orientação liberal e conservadora - na pessoa do primeiro-ministro Silvio Berlusconi, após a decisão da corte de cassação, proibiu que qualquer hospital público ou privado da Itália realizasse o procedimento de retirada da sonda alimentar de Eluana, num claro desrespeito ao Poder Judiciário da Itália. Nem mesmo o primeiro-ministro tem poder para impedir o cumprimento de uma decisão judicial.
O pai, por outro lado, pede apenas silêncio nos últimos dias de sua filha, quer apenas tranquilidade na fase final de uma batalha de 10 anos, batalha na qual ele apenas pediu que a filha pudesse ter o direito de morrer, morrer com dignidade, como todo ser humano merece. Devemos pensar no direito fundamental à morte, do mesmo jeito que pensamos no direito fundamental à vida.

Descanse em paz Eluana...